Contando minha história parte 1: A decisão

A decisão de viajar pode parecer fácil, mais fácil do que a mudança real, mas quando você começa se dá conta de que existem tantas possibilidades, tanta coisa pra resolver que pode ficar muito fácil desistir de tudo. Eu já falei aqui sobre coisas básicas pra se ter em conta antes de qualquer viagem, mas hoje quero contar sobre a minha decisão em particular.

Diferente da maioria dos brasileiros que estavam lá, eu não fui para Argentina fazer faculdade. Eu já era formada em publicidade, desde 2008. Desde a faculdade eu tinha o sonho de morar fora. A única certeza que eu tinha era essa. Ah, e que eu queria aprender espanhol. Nunca fui fã do inglês, na minha profissão ele nem conta muito e eu tenho até hoje muita dificuldade com o idioma. Até cogitei ir pra Londres, mas eu me atraia muito mais pelas fotos do que por algum relato de alguém que vivia lá.
Juntando Europa e espanhol, eu comecei a me programar para ir pra Espanha. Meus avós são portugueses, busquei muita informação sobre a dupla cidadania, meu avô inclusive me trouxe um documento de Portugal que tinha tudo o que eu precisava: certidão de nascimento, casamento, óbito da minha avó e o registro da vinda dele pro Brasil. Mas, eu precisava que um parente direto, vulgo meu pai, também tivesse a cidadania.

Meu pai nunca foi a favor de que eu viajasse, a minha mãe apesar de parecer feliz com a ideia, no fundo não achava que eu faria tudo o que eu fiz. Em resumo, não consegui a cidadania, e isso complicaria muito a minha viajem. Na época (2011-2012) a Europa passava por uma crise, e estava dificultando e muito a entrada de estrangeiros. Brasileiros então, nem se fala. Havia muitas histórias de brasileiros que eram deportados, mesmo cumprindo as exigências deles: ter uma quantia enorme de euros da conta e a passagem de volta comprada.

Foi depois de muita pesquisa que entendi que havia muitas alternativas, diferentes dos destinos tradicionais. África do Sul, República Tcheca, Nova Zelândia e América Latina. Também entendi que contratar uma empresa de intercâmbio não era o que eu queria. A intenção não era essa, eu queria ter mais liberdade quanto ao lugar onde eu ia viver e estudar. Acho que hoje em dia é muito mais fácil você se mudar sem essa ajuda, pois com a internet, blogs, grupos em redes sociais você consegue todo tipo de informação e até conhece pessoas que te ajudam com isso.

Eu nunca havia saído do país. Sempre rola um preconceito quando a gente pensa em América Latina, eu não conhecia nada, só ouvia história de viagens estilo mochilão, de montanhas, hostels e Machu Pichu. Então, estudar espanhol em algum país daqui me parecia uma loucura. É uma pena, porque a gente (sim, apesar de muitas diferenças, o Brasil faz parte disso) tem muita história e somos um povo muito receptivo, pelo menos nos poucos países que conheci no caminho.

Mas a Argentina era o destino principal de toda pesquisa. Tudo me levava a Buenos Aires. Acho que pelo seu “ar europeu” a Argentina sofre menos esse tipo de preconceito. Confesso que não foi nada disso que me atraiu, fui muito mais pelo custo de vida, proximidade, estilo de vida e pelas oportunidades. Também foi mais fácil me decidir porque um amigo meu (o mesmo que me influenciou a fazer publicidade) já tinha vivido lá. Ele me falou sobre os cursos de criação publicitária, sobre as agências e sobre o quanto isso poderia fazer bem pra minha carreira. Era a opção perfeita.

Agora eu precisava organizar mais algumas coisas: juntar dinheiro, escolher datas e passagens, procurar informações sobre a documentação, decidir que curso fazer. Me lembro que não tinha ideia de quanto tempo ficaria, nem o que faria por lá. Minha decisão foi muito mais pelo lado pessoal do que pelo lado profissional. Eu já estava economizando há algum tempo, tinha inclusive uma tabela para organizar meus gastos. Fiz alguma conta rápida e decidi que quando chegasse a determinada quantia, eu ia embora.

No meio disso tudo, meu pai ficou doente. Isso atrasou minha viagem em alguns meses. Mas também me fez pensar que se eu já tivesse viajado, não estaria com ele. Me fez pensar que você pode estar longe quando alguém precisar de você, ou você precisar de alguém. Me fez repensar família, amigos, vida e tudo mais. Foi difícil manter a decisão depois de tudo isso porque estando longe, além de perder bons momentos, você também pode perder alguns maus momentos, ou perder pessoas. Viajar é um ruptura grande não só com amigos e relações, mas com o falso conforto que a gente sente por estar ao lado de pessoas queridas o tempo todo, e as vezes não paramos pra pensar que coisas ruins podem acontecer com elas. Estar na Argentina seria estar a duas horas de São Paulo, com passagens que não eram caras na época, e isso me ajudou muuuuito a decidir. Graças a Deus meu pai ficou bem, todo mundo ficou bem, e eu pude ir tranquila pra lá.

Na verdade, eu queria muito viajar. Eu realmente precisava naquele momento mudar de ar, de cidade, estar sozinha comigo mesma. Eu queria viver outra coisa, descansar do trabalho, desfrutar o esforço de deixar de fazer tanta coisa pra economizar mais um pouco aqui e ali. Eu fui pra me conhecer, e conheci tanta coisa e tanta gente, fui parar em Bogotá, e no fim tudo valeu a pena.

Eu conheci muita gente que voltou. Muita gente que mudou de rumo lá mesmo. Gente que tá lá até hoje. Mas conheci muita gente que não sabia o que fazer. Você vai ler muita coisa antes de ir, pode falar com pessoas que adoraram fazer intercambio, com gente que vive em outro país e ama, mas a decisão é muito pessoal, e nem tudo são flores. Primeiro tem que querer de verdade ir embora. Tem que querer muito, porque você vai estar sozinho. Você aprende a cozinhar, a andar sozinho, você precisa falar com pessoas em outro idioma, você vai fazer mil coisas que nunca fez, então você precisa amar sua decisão. Tem que estar seguro de que é isso que você quer. As vezes, Buenos Aires atrai muita gente por causa da faculdade sem vestibular, ou porque algum amigo passou o fim de semana lá e tudo pareceu muito barato. Não é bem assim, você tem que estudar muito, o portunhol não vai resolver sua vida e ir como turista é beeem diferente de viver lá.

Foto clássica em San Telmo.
Os personagens ficavam espalhados pelo bairro, mas a Mafalda é a mais conhecida e sempre tinha sempre uma fila enorme pra tirar foto com ela, e com os outros não. Agora eles ficam todos juntinhos aí.

Eu amo Buenos Aires, esse blog é pra ajudar as pessoas que querem ir mas também é pra me ajudar, pra escrever sobre tudo isso. Quero voltar, hoje muito mais consciente de tudo o que eu tenho que passar (de novo) pra poder ir, mas também com a experiência de ter ido a outro país, a Colômbia, atrás de algumas coisas que não funcionaram muito bem, de me sentir triste, insatisfeita, e de viver aquele momento que eu poderia ter evitado: quando a gente se dá conta de que não fez a melhor escolha, e que é melhor voltar atrás e recomeçar.







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